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domingo, setembro 30, 2007

Óbvio Demais

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Cachorro Grande no Centro Cultural Martim Cererê
FósForo Apresenta - 28/09 - sexta-feira

Enquanto se espremiam no suor escorregadio uns dos outros, as várias centenas de humanos felizes, dançantes e sorridentes - apertados dentro da cúpula de concreto - não pareciam perceber as temperaturas crepitantes que, junto com as toneladas de fumaça de todo tipo - enjauladas dentro do teatro Pyguá, sufocavam meus pulmões desprivilegiados.


Se você acha que a voracidade elétrica e “aquela” periculosidade artística do Cachorro Grande do começo fazem parte do passado, você está certo. Mas se acha que com isso os gaúchos erraram o caminho e desandaram a receita, você está errado. Não é de hoje que o quarteto adestrou sua rebeldia de brechó e se integrou ao establishment comercial do showbiz, ampliando o horizonte de sua curta carreira, sem deixar de receber os louros de uma insuspeita popularidade (ainda que não plenamente traduzida em número de vendas, mas isso é outra história).


Mas os rapazes de terninho antiquado e boinas do vovô ainda sabem o que fazer em cima de um palco, e regeram a massa – que equilibrava latinhas de cerveja e câmeras fotográficas digitais com a mesma desenvoltura alcoólica – com o prazer despreocupado dos íntimos.


Divulgando o novo Todos os Tempos, o conjunto também fez questão de satisfazer a multidão enlouquecida e não esqueceu os hits festeiros e esporrentos de Pista Livre e de As Próximas Horas Serão Muito Boas, a exemplo da miríade guitarreira de Você Não Sabe o Que Perdeu e da indulgência psicodélica de As coisas que eu quero lhe falar.


Se há alguns anos a explosão de sessentismo idílico que emanava daquele mesmo palco, durante o show de um Cachorro Grande ainda ingênuo e deslumbrado - transpirando em bicas debaixo do veludo dos paletós -, hoje, parece maior, a culpa é menos de Beto Bruno, Marcelo Gross e cia, e mais da visibilidade crescente que atraíram exatamente com essa desafetação amotinada e reverente.


E com tantos holofotes a coisa foi perdendo o tom de brincadeira, e a profissionalização acabou por dar uma mão de verniz mercadológico na lataria vintage do grupo, que, diga-se de passagem, tirou de letra a prova de tornar-se também “produto”, além de "simplesmente" arte.


Com menos de dez anos de vida e quatro álbuns respeitáveis na bagagem, o Cachorro Grande ainda late tão alto e forte quanto antes, mas agora que a novidade passou, o público transbordou o gueto e a polidez ganhou definitivamente seu lugar em meio ao caos retrô, resta esperar que tanta estabilidade não comprometa a sinceridade, e nem a criatividade genuína que os trouxeram até aqui.


Mas acho que não, seria óbvio demais.


sexta-feira, setembro 28, 2007

"Pede pra sair, pede pra sair!!"

Tropa de Elite

Olá

# Já conferiu o vídeo-amador mais visto na última semana, protagonizado, segundo dizem web afora, pela metade feminina do White Stripes, a Meg White? Pois bem ele está aqui, mas recomendo abrir longe das vistas do seu chefe ou da sua mãe.



# A décima terceira edição do Goiânia Noise já está com o line-up fechado. Os nomes já confirmados, como os americanos Battles e The Dts, você leu alguns posts atrás, mas Sepultura, Pato Fu, Júpiter Maçã e Korzus devem figurar entre os headliners nacionais, ao lado do já revelado Mundo Livre S/A e da discreta lenda indie carioca chamada Pelvs (dona de um dos melhores discos do ano - Anotherspot).


# # Dos santos de casa, a lista já é oficial e enumera, além de MqN e Mechanics, os seguintes grupos locais:


Perfect Violence
Rollin' Chamas
Mugo
Seven
Barfly
Black Drawing Chalks
Violins
Motherfish

Spiritual Carnage
Sangue Seco
Valentina
Control Z
Woolloongabbas.


# Merecidamente no Goiânia Noise, depois dos mais de quinze anos de trajetória, o Spiritual Carnage promete ser um dos destaques do festival em 2007, um dos pontos altos da divulgação de Voices of Darkness, o primeiro álbum cheio do quinteto, lançado ano passado pela Two Beers Or Not Two Beers, selo do amigo e polemista Wander Segundo.


# # Mugo é uma das bandas que mais tem chamado a atenção do público da cidade nos últimos tempos. No segundo show da curtíssima carreira (iniciaram atividades no semestre passado), o conjunto conseguiu encher a arena do teatro Pyguá e manter a massa púbere em constante e frenético movimento, acompanhando o sobe-desce das guitarras em afinações baixíssimas, os grooves crescentes e explosivos e vocais que dançam no limite entre a fúria descontrolada e a doçura pop.


# # # O Violins é, ao lado do MqN, o santo de casa que mais fez milagres em seu próprio território. Porém, também a exemplo do MqN, não conseguiu dominar a grandiosidade do palco do teatro Oscar Niemeyer no Noise do ano passado e fez um show frio para uma platéia espalhada e desatenta – noves fora o diminuto e histérico fã-clube, que sempre se faz perceber nos shows do grupo.


# # # E as texturas lisérgicas e a experimentação despretensiosa e certeira do Seven também devem garantir o bom nome da cidade.



Tropa de Elite


# A Trama Virtual está encarregada de realizar seletivas que garantirão três vagas na escalação do Goiânia Noise. As inscrições começaram dia vinte e cinco passado e vão até dez de outubro. Se tu acha que você, seus amigos e essa coisa aí que você chama de banda tem alguma chance de convencer o pessoal da Trama e da Monstro Discos, se inscreve lá.


# # E se decepcione. (hehehe).


# Então, como milhões de brasileiros, a essa altura você também já deve ter conferido uma cópia pirata do filme mais barulhento dos últimos tempos né, o Tropa de Elite, do José Padilha? O diretor garante que esses devedês que fervem na mão dos camelôs não tem o corte final, e a obra acabada que estréia em outubro, terá diferenças na edição e acréscimo de cinco minutos na história, mas mesmo “inacabada” a fita surpreende. A crueza realista e a falta de correção política de como a versão da polícia é contada, choca e empolga.


# # Dá até pra ver, depois de assistir Tropa de Elite a molecada vai brigar pelo papel de “mocinho” nas brincadeiras de polícia e ladrão, e a farda preta dos batalhões de operações especiais espalhados pelo país (em Goiânia batizada ROTAM) passará a despertar mais uma admiração distante e reverente do que o medo/repulsa costumeiro. Não dá pra saber se isso é bom ou ruim, já que no filme a posição intransigente e psicologicamente limítrofe do protagonista Capitão Nascimento (Wagner Moura), exalta e glorifica o jeito militar de enxergar problemas, que retira sumariamente as nuances da questão e enxerga apenas os extremos. Se não é amigo, é inimigo, e inimigo só serve pra morrer ou pra fornecer informação – debaixo de muita porrada, é claro. Play!


# # # Mas se Tropa de Elite pode parecer apologia da violência policial e da tortura como forma de combate legítimo ao tráfico – opiniões mais facilmente associadas à extrema direita, o filme anterior de Padilha, o documentário Ônibus 174, “pregava” uma idéia diametralmente oposta. Ao humanizar o Sandro Nascimento, seqüestrador do ônibus do título (curiosamente com o mesmo sobrenome do capitão de Tropa de Elite), e tentar dissecar a trajetória de miséria e horror que desembocara no trágico episódio, o diretor foi acusado de extremista de esquerda, agora será que vão ter a ingenuidade de “culpá-lo” pelo contrário?




# Hoje, sexta-feira, logo mais à noite tem Cachorro Grande no Martim Cererê. O último show que acompanhei, já há quase um ano, revelou a evolução estético-mercadológica do grupo gaúcho, que pôs de lado aquela fúria incontrolável do início e adoçou o discurso, mesmo que um verniz de porra-louquice ainda acompanhe seus terninhos. E hoje, a quantas anda o “sessentismo-de-sucesso” dos rapazes?

# # Para acompanhar os quase-famosos dos pampas, o trovador caipira-indie Diego de Moraes, a gritaria garageira da Bang Bang Babies, o churrasco humorista do Rollin Chamas e a Yglo. Vai lá?

See you later



quarta-feira, setembro 19, 2007

Cidade Oculta

O Quarto das Cinzas
Foto: Renato Reis

Calango 2007 - Domingo


Pra fechar a edição 2007 do festival, a decepcionante estrela local, Vanguart, foi escalada em horário nobre, logo depois da exatidão confusa e cínica da veterana Patife Band, dona do melhor show dentre os 47, espalhados em três dias e intercalados em dois palcos.


Daniel Belleza, liderando os Corações em Fúria, manipulou a molecada como quis, e convenceu a aglomeração juvenil a destruir a grade que delimitava o fosso dos fotógrafos, expulsar a imprensa de lá e se aproximar do palco. O tecladista Astronauta Pingüim, pilotando seu moog e acompanhado por parte dos Corações em Fúria, ganhou lugar honroso nos destaques da festa, em recriações psicodélicas de temas como Smells Like Teen Spirit e Um Lugar do Caralho, Nirvana e Júpiter Maçã, respectivamente.


O Quarto das Cinzas, numa receita que centrifuga trip-hop e sotaque cearense, se revelou uma agradável surpresa, enquanto as eletroniquices bombadas e minimalistas de sua conterrânea Montage, já dona de certo prestígio nacional, inflamaram a afluência de humanos dançantes.


O rock punk, tosco e humorista da carioca The Feitos, se igualou à mato-grossense Boneca Inflável no fracasso. Com nomes como esses, não dava mesmo pra esperar alguma coisa. Já a turma do Dead Smurfs não tenta ser engraçadinha, mas conseguiu arrancar risadas divertidas com um impensado hardcore-hippie, temperado com pão-de-queijo. No começo da noite, haviam se apresentado grupos que atendiam por nomes ainda piores: Skarros e Suco di Nóis, além das locais Snorks e Branco ou Tinto.



Paulo Barnabé no comando da Patife Band
Foto: Escárnio e Osso


Depois que o Montage desmontou sua discoteca andrógina e abandonou o palco, Paulo Barnabé e a Patife Band ocuparam o tablado ao lado para os melhores quarenta minutos do Calango 2007. A aglomeração frenética que se desmobilizara rapidamente depois da saída dos cearenses não se deixou seduzir pelos retalhos melódicos pontiagudos e experimentos punk-jazzísticos da mais clássica das bandas paranaenses, e o trio dialogou com pouca gente no gargalo.


Não faltou a definitiva e genial versão musical para Poema em Linha Reta, do Fernando Pessoa, presente na trilha-sonora do longa-metragem Cidade Oculta, do Chico Botelho e co-roteirizado pelo Arrigo Barnabé, irmão mais famoso – e não menos excêntrico – de Paulo, e que também dá uma de ator, na fita.


Depois da lenda da vanguarda oitentista, o hype cuiabano pôs o time em campo. O disco da Vanguart, encartado recentemente na revista Outracoisa, gira em torno de um eixo tão saturado e pouco criativo que não empolga nem nos seus melhores momentos. Não rodou mais do que o necessário no meu player, e o show do grupo em casa, a despeito da tietagem besta dos nativos, serviu só pra confirmar o que está claro no álbum: a derivação pode até ser legal, nunca genial. E no caso do Vanguart, não é nem um, nem outro.


Rangel (Corações em Fúria) ajuda Daniel Peixoto na maquiagem,
pouco antes do Montage entrar em cena.

Foto: Renato Reis

Encerrando, de fato, os trabalhos do Calango 2007, a gaúcha Tequila Baby arregimentou os últimos insistentes com aquela mesma ladainha punk-rock de sempre, que garante para o grupo um lugar na área VIP do gênero, no Brasil, há anos. Porém, três acordes perto das quatro da manhã e depois dos vinte e cinco anos de idade, não é pra qualquer um.


Antes de conseguir vaga numa das vans que voltavam ao hotel, vi uns amigos coadjuvarem involuntariamente um “arranca-rabo” protagonizado por dois jornalistas de São Paulo, regado, com fartura, à saliva e cerveja. A briga, logo desmanchada pela famosa turma do deixa-disso, acabou por injetar adrenalina e acordar essa última leva de testemunhas, o que acabou por ocasionar uma das mais divertidas confabularias do festival, travada madrugada adentro à beira da piscina do Taiamã Plaza Hotel, com gente – músicos e jornalistas de todo o Brasil – rindo alto até o café –da–manhã ser servido, com o sol causticante de Cuiabá já alto no horizonte.


Assim o ocidente sub-equatoriano amanhecia, setembro recomeçava, e daí a pouco eu retornaria para casa.



Battles
Foto de divulgação


# O Goiânia Noise Festival, que este ano completa treze anos de vida, mais saudável do que nunca, já tem dez nomes de peso confirmados para sua edição 2007. São seis atrações internacionais, duas nacionais e duas locais. Alguns dos nomes da lista gringa já haviam sido assoprados pelo blogueiro aqui, em posts passados, o amigo leitor bem sabe. A lista segue abaixo, e vem recheada de grupos latinos.


Batlles – EUA
The Legendary Tigerman – Portugal
MqN
Mundo Livre S/A - Pernambuco
Perrosky – Chile
The DTs – EUA
Rubin – Argentina
Mechanics
Motosierra – Uruguai
Ecos Falsos – São Paulo


# # Como dito semanas atrás aqui nesse mesmo blog – que cogitava a aparição do grupo em terras goianas, o Battles é um quarteto nova-iorquino que desconstrói o rock com ferramentas de vanguarda pop, em elaborados panoramas concretistas e painéis melódicos matemáticos. A one-man-band lusitana The Legendary Tigerman, que esteve no país em 2005, traz novamente seu blues contemporâneo, fragmentado, eletrônico e psicodélico, para terras tupiniquins, ao lado do folk barulhento e saboroso do duo argentino Perrosky.


# # # O Mundo Livre S/A, todo mundo sabe, é uma das grandes bandas da geração noventa, tem uma discografia praticamente irretocável e seus shows (quase) sempre são sinônimo de diversão garantida.


The DTs
Foto de divulgação


# # # # Dave Crider, o “todo-poderoso” do cultuado selo indie americano Estrus Records, ex-líder do Mono Men e também do Watts (que já se apresentou no palco do Martim Cererê, anos atrás), desembarca em Goiânia a bordo dos DTs, fantástica formação que destila veneno clássico numa mistura que aproxima o hard-rock mais quadrado dos seventies, do suíngue sofisticado dos melhores títulos da Motown, debaixo de uma aura densa e tosca de blues garageiro. Imperdível!


Nasville Pussy em Goiânia
Foto: rOcket's Multiply


# Na sexta feira passada o Nashville Pussy, grupo mais peitudo do Tennessee, descarregou suas guitarras e clichês no palco do teatro Pyguá, no Martim Cererê, para pouco mais de duzentas almas sortudas, no lançamento da edição 2007 do Goiânia Noise Festival.


# # Ainda que o público não tenha sido o esperado, Katielynn Campbell e Ruyter Suys, as louras de posse de baixo e guitarra, incendiaram as duas centenas de criaturas suadas que dançaram durante todo o set, cantaram junto com Blaine Cartwright e estampavam sorrisos satisfeitos depois do show.


# # # Tratando com o respeito e o talento devidos, enumeraram todos os adoráveis chavões daquele hard-rock cru e despretensioso, porém imponente e teatral, que tanto agrada os ouvidos garageiros dos goianienses. Pena que a maioria deles não se apercebeu do fato.



# O Radiohead parece estar finalmente prestes a entregar o sucessor de Hail To The Thief ao mercado. Segundo informa o site do grupo, estão em fase final de masterização do álbum e em breve o track-list poderá ser conhecido na íntegra – já que algumas dessas novas canções constavam no repertório dos shows há algum tempo. Tá certo que Hail to The Thief é um discaço, mas a melhor coisa que o Thom Yorke fez nos últimos anos – talvez sua mais ousada, e bem-sucedida, aventura autoral desde OK Computer – foi mesmo The Eraser, seu primeiro disco solo.


# # Lançadas em 2006, as nove canções seduzem e comovem profundamente pelas texturas e beats eletrônicos tão ardilosamente encaixados na agonia fluida de vocais desesperadoramente belos. A obra-prima máxima da canção eletrônica do século vinte e um. Daí a enorme curiosidade para com esse próximo, e esperado, disco do(s) inglês(es).



Vou escutar o disco novo da paraense Cravo Carbono ali, depois eu volto.





sexta-feira, setembro 14, 2007

Monte Sua Banda

Macaco Bong
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Festival Calango 2007
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No sábado, dia 2 de três, se a Pública passou longe de fazer uma apresentação decente, o Móveis Coloniais de Acaju manobrou as massas – mas mesmo assim não convenceu. A Lord Crossroad, tocando em casa, foi a caricatura da vez e a Terminal Guadalupe, o Manacá, o Suposto Projeto e, principalmente, o Macaco Bong, fizeram a noite valer a pena.

A Mr. Jungle saiu lá de Roraima, e afinou suas guitarras e madeixas num culto devoto ao hard-rock cabeludo, pouco antes da High School anteceder o Suposto Projeto. Originalmente escalada para esse horário, a amapaense Stereovitrola não respondeu chamada e foi substituída pelo projeto paralelo de parte do Cravo Carbono (que se apresentara na sexta-feira), apelidado didaticamente Suposto Projeto.

Em cima do palco o trio construiu um monumento de suíngue que fez a porção menos intransigente da platéia reverenciar, dançando, a típica guitarrada do Pará. Um dos pontos altos de uma noite irregular.



Terminal Guadalupe
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Depois da mato-grossense Big Trip e da paulista Seminal, a novata Manacá exibiu todo seu orgulho carioca, personificado na presença sensualmente simpática da vocalista Letícia Persiles, que administrava a melodia entre guitarras nerd e ginga de malandro.
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Seguindo, a curitibana Terminal Guadalupe ocupou o palco ao lado e demoliu minhas expectativas (que não eram das mais positivas). Você vai perder o Chão, segundo álbum do grupo, jaz empoeirado na estante do blogueiro aqui, que nunca viu muita beleza no disco. Porém, de posse das atenções do público cuiabano e divulgando o terceiro A Marcha dos Invisíveis, a Terminal Guadalupe desvendou talento e habilidade ao afastar-se dos anos oitenta, e em volumes altíssimos se candidatou ao papel de personagem principal da noite.

As apresentações da The Melt, Supergalo e Mandala Soul me deram tempo para um passeio pela arena. Na tenda Monte Sua Banda, a Mr. Jungle arrancou mais aplausos e elogios do que no comando do palco oficial. Uma entrevista com a Cravo Carbono/Suposto Projeto me liberou apenas para os dez minutos finais da carioca Cabaret, logo antes do trio mais importante do meio-oeste brasileiro plugar baixo e guitarra.

Mesmo sem um disco cheio (apenas dois EP’s) o Macaco Bong já figura na lista dos nomes mais talentosos e promissores dessa novíssima geração da música jovem feita no Brasil. O instrumental poderoso e insinuante do grupo foi bem atrapalhado pelo som do palco dois, que tirava a potência da guitarra de Bruno Kaiapi e escondia o contra-baixo do Ney Hugo. Somente da metade da apresentação pra lá é que o três músicos conseguiram, de fato, se comunicar com a multidão aglomerada. Ainda assim fizeram o melhor show de sábado, e um dos melhores do festival.

Os gaúchos da Pública subiram ao palco desmotivados, e cumpriram tabela num show burocrático e frígido.Nem o ótimo single Long Plays – disparado a melhor canção do quinteto – ajudou a apagar a aura de tédio e indiferença.

Pondo um fim à sabatina, o espalhafato constrangedor do Lord Crossroad fez as “honras”, antes da histeria coletiva que a atuação frenética do Móveis Coloniais de Acaju provocou na pequena multidão, explodir no gargalo.
Aproveitei a deixa e, tomando a última coca-cola da noite, fui me embora pensar no café-da-manhã.



Vou ali assistir o Nashville Pussy em ação, depois a gente conversa mais. Já, já entra aqui um post sobre o terceiro, e último, dia de Calango.

segunda-feira, setembro 10, 2007

Ofender e Transformar!

Debate
Fotos deste post:Renato Reis


Calango 2007


Em Cuiabá, ar-condicionado até em qualquer banca de revista. Não dá para dispensar o refrigerador numa terra em que os termômetros orbitam os quarenta graus. Assim, somente à noite a cidade se revela, de fato, para o turista ocasional. No caso, eu.


Ensaiei umas caminhadas vespertinas, pós-almoço, pela cidade, mas o sol queimava com tanta força, que me perguntei se deus não tinha algo pessoal contra esse pedacinho do planeta. Vai arder assim lá no inferno.


Como disse, qualquer banca de revista cuiabana tem um ar-condicionado trabalhando no máximo, e foi o refúgio mais óbvio para o turista incomodado. No caso, eu. Pedi a Rolling Stone nova (com aquela beleza da Grazi Massafera na capa), mas sabia que ainda não ia ter chegado, eu estava em Cuiabá, no centro-oeste, afinal. Solicitei o magazine só pra enrolar um pouquinho, poder dar uma olhada em volta e enxugar o suor que escorria em gotas rápidas na minha testa. Acabei comprando um número atrasado da Grandes Guerras, que estampava na capa uma chamada sobre a participação militar do Brasil na Segunda Guerra Mundial, e outra sobre a Segunda Guerra Púnica, quando Aníbal, o general cartaginês, perdeu a oportunidade de invadir Roma e mudar o rumo do ocidente. Comprei a revista e voltei derretendo para o hotel. Daí algumas poucas horas começaria o Calango 2007. Era sexta-feira e agosto se despedia mais uma vez.


Já no meio da madrugada, no show relâmpago da Debate – penúltima atração da noite –, a precisão cerebral, porém caótica, dos paulistanos se fez símbolo sonoro, dentro da minha cabeça de vento, para toda aquela energia racionalmente brutal das guerras. A coisa é pensada para ofender e transformar, mesmo que o preço seja atravessar o caos e enxergar beleza nele. O “discurso sonoro” do trio é surdo, não tem cognição quase nenhuma e nem é bonito, mas o aparente fractal matemático, ordenado e regido pelo Richard Ribeiro, fascina pelo mesmo motivo que a história das guerras atrai tanta gente: pela intensidade de fúria controlada e pela desatenção voluntária, e extrema, para com os regras praticadas pela maioria.


Assim foi o melhor show da primeira noite do festival.




Maldita

Antes deles e abusando daquela conhecida fórmula que vai do circo de horrores, com insinuações sado-masoquistas, ao enorme apelo que as caras-de-mau e afinações baixas tem junto ao público adolescente, a carioca Maldita havia reunido e incendiado a multidão diante do palco 2, logo depois da cuiabana Revoltz cometer uma das melhores apresentações da noite, numa desambição jovem-guardiana suada, espontânea e festeira.


Revoltz

Por falar em cara-de-mau, elas tiveram lugar garantido nos três dias de festival. No começo da noite, assim que pus os pés na arena, a também cuiabana Aoxin já exibia sua cólera púbere no palco 1, diante dos coleguinhas não menos “mal-encarados”. A despeito do pastiche pobre que vai do pop-core de CPM22 e congêneres, ao nu-metal descartável de linkin Park, o grupelho conseguiu atenção empolgada de um público ainda pequeno.


Depois deles a Unchronics, banda mais votada nas seletivas do festival realizadas em Goiânia, ergueu suas guitarras, cabeleiras e flanelões xadrez, num saudável momento anos noventa, que temperou a densidade melódica do grunge com o azedume quadrado do hard-rock setentista. Os Parkers, quarteto do vizinho Mato-Grosso do Sul, acionaram os clichês mais dançantes do punk-rock para animar a crescente platéia, que ensaiou a primeira rodinha de pogo do calango 2007, antecedendo a pretensa, e infeliz, piada psicodélica Johnny Alfredo e seus Neurônios Mongóis.


Fernando Prates, guitarrista da mineira Carolina Diz, ganha a vida no balcão de uma vídeo-locadora pornô em Belo-Horizonte, é fã confesso de Nick Drake e, acompanhado pelos amigos, protagonizou um dos bons momentos da noite, num re-processamento do lado mais introspectivo – porém não menos barulhento – da música pop, do Radiohead pra cá. Devotos do rock clássico, a local Cachorro Doido gastou seus cartuchos com mira de franco-atirador, esquentando o palco para as atuações da paraense Cravo Carbono, da acreana Camundogs e da cuiabana Chilli Mostarda.


Os Rockfellers não tiveram sorte, e o já problemático palco 2 se revelou um pesadelo para os goianos. O som que fugia dos P.A.s confundia baixo e guitarra com os vocais, enquanto a bateria se desequilibrava em cima de sua armação, e castigava o baterista Léo Rockfeller. Atrapalhado pela sucessão murphyana de acontecimentos, o quarteto deixou o tablado deveras insatisfeito, logo antes da Revoltz festejar com a massa no palco ao lado, como dito lá em cima.


Hellzen

Escalada para fechar a primeira noite do Calango 2007 ao lado dos uruguaios do Supersônicos, a Fuzzly, banda cuiabana radicada em São Paulo, não compareceu, e cedeu a vez para o thrash metal oitentista infanto-juvenil do Hellzen, que poderia ter se dado melhor, não fosse a precariedade do som do palco 2. Dando cabo da primeira noite de festival, os Supersônicos apresentaram seu power-pop surfista para os últimos resistentes, já perto das quatro da matina, enquanto a praça de alimentação da arena acolhia a multidão de desistentes famintos e o portão se despedia de uma fila interminável de humanos exaustos.


Fim do primeiro tempo.


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# A grande Pata de Elefante está para lançar seu segundo disco, que provavelmente figurará no topo de muitas das listas de melhores do ano, que logo, logo começam a aparecer web afora. Um Olho no Fósforo, Outro na Fagulha traz a genialidade instrumental de um trio mais amadurecido e com uma música ainda mais caudalosa, intensa e chapada, feito qualquer clássico do rock que se preze. Goiânia espera ansiosamente por mais uma apresentação dos gaúchos, que estiveram aqui pela última vez no Goiânia Noise do ano passado, e não satisfizeram por completo a sede de sua pequena legião de fãs com apenas meia-hora de show. Fique atento, a bolachinha deve aparecer nas lojas mais argutas (virtuais ou não) em outubro.


# # Para sentir o gostinho doce desse discaço que está para chegar ao mercado, aperte o play na janelinha aí embaixo e se delicie com um trecho da faixa título, gravado durante um show da Pata no Abbey Road Pub, em Porto Alegre:



# A estréia em disco da cuiabana Vanguart, encartada na última edição da revista Outracoisa, não me agradou mesmo, do que eu já desconfiava. Escutei com paciência e boa vonttade mas, apesar de alguns bons momentos – como Semáforo e Cachaça, a coisa gira em torno de um eixo saturado e pouco criativo. Já disse mais de uma vez, a melhor banda mato-grossense é um trio instrumental (assim como a melhor banda gaúcha), e ainda não lançou seu primeiro disco cheio.


# # Numa parceria entre o selo goiano Fósforo Records e o coletivo cuiabano Espaço Cubo, foi lançado recentemente A Marcha dos Invisíveis, terceiro disco da Terminal Guadalupe. O álbum afasta os curitibanos dos anos oitenta, foi lançado em SMD (Semi-Metallic Disc) acompanhado de um SMDV (SMDVideo), com o vídeo-clipe de Pernambuco Chorou, e seu making-off, e custa módicos treze reais. Depois falo mais sobre isso.



# A partir de sexta-feira, dia 14, acontece mais a terceira edição do Jambolada, festival lá de Uberlândia que integra a Abrafin e amplia a teia de ação da Fora do Eixo. Além da programação musical, a festa também reserva lugar para o já tradicional ciclo de debates, que contará com nomes como Pablo Capilé (Espaço Cubo –MT), Marcelo Domingues (Braço Direito–PR) e Rodrigo Lariú (Midsummer Madness–RJ).


# # Aí embaixo você confere a programação. Atenção para o Tom Zé, meio perdido ali entre os indies na sexta-feira, e para o Duofel, assobiando e olhando pra cima, no domingo. Grande sacada. ;)


JAMBOLADA 2007


14/09 | Sexta-feira
19:00 - Vandaluz (MG)
19:45 - Ácidogroove (MG)
20: 30 - Proa (MG)
21:15 - Falcatrua (MG)
22:00 - Juanna Barbera (MG)
22:45 - Tom Zé
00:30 - Los Porongas (AC)
01:15 - Vanguart (MT)
02:00 - Porcas Borboletas (MG)
02:45 - Daniel Belleza & Os Corações em Fúria (SP)


15/09 | Sábado
19:00 h – Um Bando e o Fim da Quadrilha (MG)
19:45 h - The Dead Lover's Twisted Heart (MG)
20:30 h - Super HI-FI (RJ)
21:15 h - Estrume'n'tal (MG)
22:00 h - Dead Smurfs (MG)
22:45 h – Mechanics (GO)
23:30 h – Supergalo (DF)
00:15 h - Superguidis (RS)
01:00 h - Antena Buriti (MG)
02:00 h - Nação Zumbi


16/09 | Domingo
12:00 h Gira Lua(MG)
13:00 h Duofel (SP)
14:00 h Makely Ka (MG)
15:00 h O Quarto das Cinzas (CE)
16:00 h Móveis Coloniais de Acaju (DF)



Tchau



quinta-feira, setembro 06, 2007

Arremesso de Cerveja à Distância!


Letícia Persiles, do Manacá.



De volta à Goiânia.


# Acabou no último domingo a edição 2007 do festival Calango, em Cuiabá. Este blogueiro que vos digita acompanhou in loco os três dias de festa e em breve publica aqui o texto completo sobre o festival. Já para o próximo número da revista Decibélica, garanto matéria larga e detalhada sobre a folia.

# # Mas dá pra adiantar que Cuiabá fez jus à sua fama de cidade-inferno, e cozinhou a carne dos desacostumados com suas temperaturas de forno micro-ondas. Nas madrugadas – prolongadas no hotel -, apesar da aparente discrição coletiva, era possível ver/ouvir acontecimentos curiosos e/ou quase bizarros, enquanto, à beira da piscina, confabularias eram travadas, em meio à gargalhadas embriagadas.

# # # Já no Museu do Rio, local da arena do festival, o backstage presenciou desde um quase-combate físico (e um arremesso-de-cerveja-à-distância) - logo apaziguado pela turma do deixa-disso -, até a transmissão ao vivo dos shows, via web rádio, executada pelo amigo e editor do programa Reator, Pedro Fernandes.

# # # # O Macaco Bong fez a performance hipnótica e exultante de sempre, porém dessa vez prejudicada pela má equalização do equipamento do palco 2, que insistiu em atrapalhar o som durante quase todo o festival.

# A Patife Band – formação paranaense que margeou o boom do BRock oitentista, flertou forte com a Vanguarda Paulistana, mas que nunca atingiu sucesso comercial – fez a melhor apresentação do Calango 2007. A experimentação de Paulo Barnabé e cia, fragmentada em recortes melódicos que brincam a sério com a faceta menos ortodoxa da música punk, não atraiu a massa para o gargalo – o que era de se esperar –, mas conseguiu rechear de estranheza e inquietação o cenário indie-guitarreiro, quase absoluto nas três noites.

# # Já o Daniel Belleza e seus Corações em Fúria comandaram o número mais organicamente interativo do festival. Separado de seu público pela grade de proteção que delimita o fosso reservado para jornalistas e fotógrafos, um purpurinado Daniel Belleza conclamou a pequena multidão a invadir a tal área V.I.P., e se aproximar do palco. Completou o apelo com um “Eu não toco para a imprensa, eu toco é para vocês!”. A resposta da massa foi imediata, e garotos e garotas aos montes passaram a pular as grades, que logo cederam e jazeram retorcidas sob os saltitantes invasores, até que uma equipe de seguranças restabelecesse a separação.

# # # Cercado de comentários sobre lascivos uivos vespertinos, a cearense O Quarto das Cinzas desvendou seu tramado que envolve os delírios sutis do trip-hop, as guitarras do rock, e toda a elegância da tradição musical brasileira, numa das gratas surpresas do festival. O casal (ela afinadíssima) acompanhado apenas de mais um músico e de um lap-top, dispensou o baterista e conseguiu, mesmo entre as piadinhas, um honroso lugar na lista dos melhores do Calango 2007.

# # # # A simetria plástica da carioca Manacá, outra revelação do festival, se vale de um pacote fechado: da beleza vivaz e tatuadíssima, em conjunto com a voz algodoada de Letícia Persiles, combinada com guitarras repletas de acidez pop, emolduradas num contexto que permite uma associação abstrata, e nada forçada, entre lembranças de Wezzer e Novos Baianos. Tudo num mesmo pacote.






# Das bandas ruins do festival eu falo na matéria completa, mas antecipo que, em muitos casos simplesmente fugi, e me ocupei na sala de imprensa ou em papos animados e engraçadíssimos com o Bruno Dias, o Terence Machado e o Alexandre Moreira, do Urbanaque (SP), do Alto Falante (MG) e do Loaded E-Zine (SP), respectivamente.

# # O gaúcho radicado em São Paulo Astronauta Pingüim também teve seus quarenta minutos de glória em Cuiabá, recriando, numa interface entre o sessentismo psicodélico e a jovem jovem-guarda, clássicos daqui e do resto do mundo. Detalhe: Pingüim se vale de sintetizadores para ocupar a função que normalmente seria designada à guitarra, e cometeu as peripécias mais saborosamente vintage do festival, no comando de seu moog.

# # # Durante os quatro dias em que estive em Cuiabá, meus fones de ouvido acompanharam quase todos os raros momentos solitários. Entupi meus tímpanos com o Release the Stars, discão que o Rufus Wainwright lançou no primeiro semestre. A dobradinha sinfônica de Slideshow e Tulsa é de despedaçar corações, sensíveis ou não. A apoteose íntima do canadense encanta nos dois extremos.

# # # # Outro que acompanhou os momentos de reclusão do blogueiro em meio à paisagem árida da capital do Mato-Grosso, foi o classicaço Badmotorfinger, do Soundgarden. Há tempos não escutava esse álbum de ponta a ponta, e num papo descontraído com o pessoal da mineira Carolina Diz, o nano alto-falante do meu mp3 player foi de Rusty Cage a New Damage sem interrupções.




Vou ali assistir o DVD do Terrminal Guadalupe, o primeiro fruto da parceria entre a goiana Fósforo Records e a cuiabana Cubo Discos. Depois te conto. Daqui a pouco eu volto com o Libertad, novo do Velvet Revolver, com algumas novidades e com mais Calango 2007.


Ok?