A semana começou quente para quem produz (e, por que não, consome) eventos do rock independente em Goiânia. Tudo por causa da carta que o diretor de teatro Marcos Fayad enviou à solenidade de abertura do 1° Fórum Goiano de Cultura, realizado pela AGEPEL (Agência Cultural do Governo do Estado) nas dependências do Centro Cultural Martim Cererê na última segunda-feira. O diretor, que fez questão no texto da carta de lembrar seu papel na criação do Centro, em 1988, fez uma reclamação veemente acerca do que chamou de “desvirtuamento da proposta” original de ocupação do lugar, que, ainda segundo sua carta, está “ocioso e entregue apenas a grupos de rock que incomodam a vizinhança”.
Até aí “tudo bem”, já que “vizinhos versus bandas-de-rock” é uma equação fácil de fazer a média engolir, mas Fayad foi além e, revelando-se um dos vizinhos incomodados (conflito de interesses?), confessou ter medo de sair de casa em dias de shows no Martim, medo esse causado pelos “camisas-pretas”, indignos responsáveis por sua garagem amanhecer repleta de cacos de vidro de garrafas de vinho barato (se fosse um Chardonnay tudo bem?) depois dos shows.
A reação dos produtores-indie foi imediata e à altura do absurdo. Fabrício Nobre (MqN/Monstro Discos), apontando a carga de preconceito que a declaração do diretor não fez questão de esconder, se disse “... Chocado! Parecia um pastor falando, e não um diretor de teatro.”.
Colocando panos quentes na polêmica, a recém-empossada diretora do Martim Cererê, Tetê Caetano (que também veio das artes cênicas) disse que a AGEPEL sofre pressão sim dos moradores próximos ao Centro Cultural, por causa do barulho, mas que “Não existe a possibilidade de o rock perder seu espaço, assim como as outras atividades artísticas. Não podemos interromper qualquer segmento. O Martim Cererê é uma fábrica de arte.”
Os debates do Fórum Goiano de Cultura continuam na segunda e terça-feira próximas, e pelo jeito o circo vai pegar fogo. Agora, pensando aqui com meus botões (e com alguns colegas de trabalho, todos interessados em rock, mas não tão envolvidos com a cena local), em que estado o Martim se encontraria hoje, caso não fosse largamente ocupado pelo pessoal da música independente? Nenhuma peça de teatro em cartaz em algum dos três teatros do M.C., por mais popular e “incrível” que seja, consegue mobilizar o equivalente a um terço do público que faz o Martim ferver sob uma cultura urbana tão rica quanto genuína a cada fim-de-semana. Não fossem os "camisas-pretas" (que ocupam, em maior ou menor grau, o lugar desde seu segundo ano de vida – 1989) o Martim, muito provavelmente, estaria entregue aos mendigos e marginais, ou, muito pior, ao nocivo, pouco talentoso e culturalmente autista mesmo grupinho que, por exemplo, monopoliza o line-up dos festivais de música patrocinados pelo Estado.
Quem deu relevância, orgânica, verdadeira e genuína ao Martim Cererê foram os festivais e shows de rock, que, além de tudo, alçaram o Centro Cultural à categoria de legenda cultural goiana. Mesmo que restrito a um nicho, de norte a sul do Brasil o Martim é tido, tanto por produtores quanto pelo público, como referência no quesito espaço ideal para shows de médio-porte. Se o teatro goiano, com todo o pioneirismo arrogado para si, não conseguiu chegar nem perto de dar tamanha projeção ao M.C., que descubra outro meio de capitalizar sua própria irrelevância. Ou você acha que a repercussão desse teatro goiano, como um todo, ainda se acotovela dentro das fronteiras do Estado por amor às origens?
O melhor show do independente nacional passou por Goiânia novamente, no último sábado. Dentro da programação do mini-festival Móveis Convida - capitaneado pela big-band candanga Móveis Coloniais de Acaju, o trio cuiabano Macaco Bong, mais uma vez, mostrou o por que de seu primeiro disco ter encabeçado a lista de melhores de 2008 da Rolling Stone Brasil, deixando pra trás gente grande, como o Lenine e o Skank, ou fenômenos explosivos, como a Mallu Magalhães.
O Macaco Bong conseguiu afinar a opinião da crítica especializada com a do público, e o teatro cheio se deixou hipnotizar, satisfeito, pelas sutis tremulinas jazzísticas recortadas por detonações de uma instintiva e visceral fúria instrumental, que, merecidamente, está conseguindo extrapolar as fronteiras nacionais.
Depois de quase 1 hora de transe, quase no final, foi engraçado ver um dos guris mais atentos e empolgados da platéia esgoelar, para o guitarrista Bruno Kayapy, o que parecia ser uma proposta indecente: “Vamodahmaisumaaaa!”. Na época das gravações do disco (que foi registrado aqui em Goiânia), imaginei exatamente uma cena parecida, já que a última música do álbum, intitulada exatamente“Vamodahmaisuma”, é também uma das melhores do track-list.
Antes do MB, o Galinha Preta (uma das mais divertidas bandas de Brasília) arrancou muitos aplausos de um teatro também lotado, e a culpa é menos de sua música e mais da performance cômica e absolutamente espontânea de seu vocalista, o Frango (que acumula a função de técnico de áudio do Móveis Coloniais de Acaju). Hardcore e/ou grindcore, não faz a menor diferença, a música aqui é um mero acessório para o desempenho humorístico impagável do vocalista e, ao contrário do que podem pensar os puristas underground, isso é um elogio dos grandes.
A primeira atração da noite foi o recentemente “descoberto” Black Drawing Chalks, mas, assim como durante o show do Móveis, dediquei meu tempo ao convívio social com a fauna colorida (e não de camisas-pretas) que movimentava o pátio do Martim, já que perdi a conta de quantos shows, de um e de outro, eu já presenciei (e gostei).
# Já fez uma visita ao Goiânia Rock City, site cool assinado pelo Alessandro Ferro e editado por mim, feito pra molecada do rock se sentir em casa? Botei lá, hoje mais cedo, uma pequena matéria sobre o Twitter, fenômeno que está se popularizando tanto, que, tenho "medo", logo logo vai tomar o lugar do Orkut na preferência virtual nacional. Vai lá, é só um clique!
P.S: O Bananada está chegando, e a lista das bandas locais convocadas para o festival saiu. Acompanhe:
Diego de Moraes e o Sindicato
Barfly
The Backbiters
Shakemakers
Aircraft
Postfive
Black Drawing Chalks
Johnny Suxxx & The Fuckin' Boys
MQN
Technicolor
Perito Moreno (projeto solo de Beto Cupertino, ex-Violins)
T.S.A. (Jataí - GO)
Mugo
Bang Bang Babies
Fígado Killer
Versus AD
Satva
MC Dyskreto
Tchau!
quarta-feira, abril 08, 2009
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6 comentários:
o teatro goiano cabe direitinho no zabriskie. o martin cererê é muito grande para ele e essa pequenez é culpa exclusiva da indigência das nossas produções teatrais. cada um tem que reconhecer sua dimensão. o mqn sabe que não serve para tocar no goiânia arena (sozinho, com o deep purple não vale). é apenas um fato, um dado numérico. isso não faz ninguém melhor que ninguém. para aceitarmos como gradiente de qualidade a idéia contida na afirmação, correta, de que o teatro não consegue mobilizar o equivalente a um terço do público do rock, teríamos que admitir que calipso do pará é a melhor coisa que existe na música hoje.
Higor, o texto ficou uma pérola, só faria uma ressalva. O teatro (goiano ou não) não é o Fayad.
Cipras
massa demais! pena que muito dificilmente os roqueiros perderão o espaço.
massa também cobrarem diploma de música e barrarem as produções dessa tal cena goiana.
mas é óbvio demais que vai dar em nada isso ai. uma pena! fazer e ouvir musica, rock! talvez passasse a ser uma coisa legal aqui nos goiás...
aliás, aposto que os tais produtores do rock goiano quando arrumarem um espaço mais lucrativo, amplo, etc vão migrar e esquecer essa porra de martim.
a carta q o fayad escreveu pro popular é ainda mais preconceituosa e sem fundamento q a carta lida no fórum...
pro cara, o rock que é mostrado no cererê nao passa de uma "reprodução do modelo norte-americano dos anos 80"...
porra, é dificil ouvir isso!
"pouco talentoso e culturalmente autista mesmo grupinho que, por exemplo, monopoliza o line-up dos festivais de música patrocinados pelo Estado."
Hahhahaha. A-DO-REI
Se o diretor de teatro é responsável pela criação do M C. isso não dá a ele direito ou propriedade sobre o mesmo, parece uma postura narcisista. Por outro lado, acho que essa questão de qts pessoas o rock ou o teatro mobilizam não é um mérito, muito menos dos roqueiros Goianos, pq o rock já mobiliza mais pessoas em todo o mundo pois há uma facilidade de propagação. Se isso significasse qualidade, as musicas feitas para manipular a grande massa,(que são um lixo), teriam qualidade assim como os importados da China, os produtos 1,99 e etc. Outra coisa é sobre os "camisas pretas", se é verdade que eles tomam vinho e quebram cacos de vidro na porta dos outros, não importa a marca, estão agindo como marginais e não podem reclamar, mas se não for verdade isso sobre eles, cabe uma denuncia quanto a tal calúnia.
O que me parece que está acontecendo aqui é uma falta de respeito, ética e maturidade das duas partes.
Se as partes não começarem a raciocinar e se entender vão se torturar a vida inteira (bom p os masoquistas não sei se é caso.
Desejo boa sorte aos dois lados.
Nádiaanis
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