Afastado de teclados e logins desde a semana passada, já que o pecê que edita esta tela resolveu se internar para uma merecida manutenção, volto hoje teclando de uma “agradável” lan house, que oferece música ambiente (ruim) e ar-condicionado na capacidade mínima. Já estou com saudades do pecê, que ainda reluta em voltar ao trabalho, relaxado em seu retiro de conservação. Mesmo assim, vai lendo aí:
# O primeiro “anti-herói” do rock brasileiro do novo milênio já tem nome e obra. Flávio Basso, aquele que dividia o cachê com o TNT e o Cascavelletes nos anos oitenta, não é o mesmo Júpiter Maçã de hoje em dia. Nem o Júpiter Maçã de A Sétima Efervescência – aquela gema do escárnio multi-colorido – é o mesmo de Uma Tarde na Fruteira.
Durante o último Goiânia Noise Festival tentei entrevistar o artista (que deve se confundir tanto com o personagem dentro daquela mente psicótica...) e dei com a cara na porta. A entrevista acabou acontecendo, mas foi a conferência mais estranha e silenciosa de todos os tempos. Ele, a cada pergunta simples sobre o disco, passeava demoradamente o olhar pelo teto do camarim, e depois de um longo tempo em silêncio, me olhava novamente e respondia com duas ou três palavras que não faziam sentido algum. Ainda insisti por umas duas ou três vezes, mas quando ele se inclinou na poltrona, depois de girar os olhos pelo teto, aproximou-se do microfone, o segurou delicadamente com apenas três dedos (o mindinho levantado) e pediu, revirando as pupilas, que as pessoas se masturbassem mais, dei por encerrada a nossa conversa.
O estranho é que, enquanto ajudava a Andréa Miklos (a cinegrafista) a enrolar o cabo da câmera, ele se injetou de uma lucidez instantânea e levantou-se perguntando o que eu tinha achado do papo, sugerindo “inocentemente” que gravássemos de novo. Tarde demais.
Uma Tarde na Fruteira é o disco de um anti-herói em seu melhor momento. Foi gravado há mais de três anos, lançado apenas na Espanha (no Brasil só haviam saído três músicas, em compactos em vinil), e só agora ganha uma caprichada edição nacional, pelas mãos da Monstro Discos.
Num caleidoscópio multi-cor de elegância psicodélica – disfarçada astutamente com pitadas de escracho popular, Uma Tarde... se revela a obra-prima da pretensão degenerada e espontânea de um artista tão verdadeiro quanto irregular. É a simbiose perfeita entre a piada explícita e berrante de A Sétima Efervescência, e a sutileza blasé de Plastic Soda – seus melhores momentos em disco.
No encarte generoso, não há letra de nenhuma das canções, só o básico da ficha técnica. O resto do bolo de páginas é dedicado a um ensaio fotográfico com um Júpiter Maçã pretensamente camaleônico, compondo com uma idéia “glamourosa” de decadência bukowskiana, em cenários cheios de rachaduras, remendos e escadas estreitas e descascadas.
Uma Tarde na Fruteira é o disco definitivo de um Júpiter Maçã envelhecido, maduro mas ainda capaz de um insuspeito e mortiço frescor mofado, hábil o bastante para combinar o primitivismo corporal do suíngue alinhado daquele Jorge Ben de outros tempos, com as pirações mais profundas do psicodelismo, citando textualmente, em meio ao caos polifônico, Woody Allen, Tom Zé, Aldous Huxley e Mutantes, além de emprestar de Bob Dylan, Arnaldo Baptista e de seu próprio passado, a inspiração para alguns dos melhores momentos do rock brasileiro contemporâneo.
# Na última sexta feira fui até o CETE (Centro de Tecnologias do Espetáculo), atrás da festa de re-inauguração da Mostra Oito pras Onze, que costuma exibir cult movies nas madrugadas que separam o sábado do domingo, lá no Cine Goiânia Ouro.
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Pois bem, pra começo de conversa a fila para entrar dava umas boas voltas no estacionamento do lugar, que é um antigo prédio da prefeitura, com vários andares quase sem paredes internas e com janelões que dão uma visão privilegiada da avenida anhangüera, via que atravessa Goiânia quase de ponta a ponta. Grandes galpões empilhados um em cima do outro. Uma vez lá dentro, de chopp na mão, subi até a segunda pista (eram duas, no primeiro e segundo andares), e me instalei lá com os meus amigos, no meio do zoológico urbano que se espremia ao redor de um sofá quadrado. Depois de engolir dois ou três chopps, e experimentar alguns goles do uísque que o Diogo (da Monstro Discos) carregava a tiracolo, me vi dependurado em velhos hits "cafonas" que tanto tem feito sucesso de novo, nas mais variadas freguesias.
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Amaciado pelo álcool eu suportei bem até a empolgação estéril da curta apresentação da Madame Mim, que pulando feito um macaco rebelde e anfetaminado, em cima do sofá – que acabou fazendo papel de palco, satisfez a sanha dançarina dos coloridos moderninhos de plantão.
A pista de baixo, ainda que com menor audiência, ganhava na escolha dos repertórios, e desfilava jóias do soul, funk e afins, servindo de trilha sonora pra quem estava mais interessado em bater um papo, dançar sem afetação e não se esfregar no suor alheio. Grande festa, num lugar que DEVIA ser aproveitado mais vezes para eventos do gênero. Mas como em Goiânia a ordem-do-dia é sempre reclamar, vi gente criticando a falta de um elevador (!), para conduzir os humanos de uma pista para outra.
# Navega pelo web quatro músicas que seriam sobras de estúdio da gravação dos ótimos Tim Maia Racional – de setenta e quatro (volume um) e setenta e cinco (volume dois). Recentemente Tim Maia voltou a ser pauta no mondo pop nacional, por causa do recém lançado livro do Nelson Motta, Vale Tudo, que biografa a vida desregrada, genial e contraditória do maior dos nossos soulmen.
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Racional foi o ápice criativo da carreira do síndico, parido na metade de uma década de incrível fertilidade para sua discografia - que depois do nascer dos anos oitenta nunca mais conseguiu restabelecer o viço poderoso desse período, e caiu numa irregularidade artística que o acompanharia pelo resto de sua vida, assim como seu comportamento polêmico e politicamente incorreto até o osso.
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Se você ficou curioso com essas peças “esquecidas”, clique aqui e bom download.
# Nascido como lista de discussão na internet, o festival Nordeste Independente conseguiu romper a barreira das mail-box no ano passado, e em dois mil e oito realiza sua segunda edição como festa da vida real, espalhando o melhor da produção local para dialogar com seu próprio público, conversar com as platéias vizinhas e, além de tudo, integrar o Nordeste numa imensa folia roqueira anual. O festival itinerante vai percorrer seis cidades (Alagoinhas, Camaçari, João Pessoa, Natal, Recife e Salvador), em cinco estados (Bahia, Rio Grande do Norte, Paraíba, Ceará e Pernambuco), e canções sem aquele sotaque tão característico, só mesmo as do Lafusa, de Brasília, e do Rock Rocket, de São Paulo (e da cearense O Garfo, que se exime do sotaque por ser um trio instrumental). As bandas que vão compor os vários line up’s do Nordeste Independente são essas aí embaixo:
DOMBEN, PEIXE COCO, DISTRO, O GARFO (CE), LAFUSA, OS REIS DA COCADA PRETA (PB), BARBIEKILL, ORQUESTRA BOCA SECA, THE VOLTA, CALISTOGA, CAMARONES ORQUESTRA GUITARRÍSTICA, BON VIVANT (PE), THE SINKS, GEORGE BELASCO E O CÃO ANDALUZ (CE), ROCK ROCKET (SP), MADALENA MOOG, SWEET FANNY ADAMS, AMP, THE DEAD SUPERSTARS, MORMAÇO, NUDA, DJ ANDRÉ, INVENTURA, KHARMA, MATIZ, OS IRMÃOS DA BAILARINA, DEMOISELLE, A FÁBRICA, DECLINIUM, LADRÕES ENGRAVATADOS, PSICOPOP, HOMEM METEORO
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# A notícia quem deu foi o portal de música do UOL, e é mais ou menos assim:
A revista americana "Maxim" pediu desculpas
aos leitores depois de ter criticado o último disco
da banda Black Crowes, sem que o crítico tenha
ouvido o CD inteiro.
Em sua edição de Março, a revista deu nota cinco (duas estrelas e meia, em cinco possíveis), para Warpaint, o esperado disco novo do fabuloso grupo dos irmãos Robinson. Acontece que a banda garante que não há copias finalizadas disponíveis e que, portanto, o jornalista que assinou a crítica só poderia estar, simplesmente, mentindo. A assessoria do Black Crowes garante ainda que apenas uma música, o single Goodbye Daughters of the Revolution, foi ouvida pelo autor do texto e sua editoria, assim como por qualquer humano interessado no conjunto e munido de uma conexão à Internet.
A revista reconheceu que sua política de resenhar apenas discos que tenham sido ouvidos na íntegra foi desprespeitada, mas nada disse a respeito de apenas uma das canções do track list estar disponível para audição.
A agonia pelo furo de notícia levada aos limites da burrice cega.
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