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quinta-feira, agosto 21, 2008

Maré a Favor

# Cumprindo pauta para o projeto de uma revista que tenta sair da gaveta, fui atrás do último disco da Adriana Calcanhoto. E não é que o álbum vale a pena? Olha só:
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David Bowie?
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Maré – Adriana Calcanhoto
Sony-BMG – 2008

Maré é o oitavo disco da carreira de Adriana Calcanhoto, e o segundo do que a cantora batizou de trilogia do mar, iniciada dez anos atrás com Marítimo. Com canções de Waly Salomão, Dorival Caymmi, Péricles Cavalcanti, Antonio Cicero, além de Dé Palmeira, Bebel Gilberto e Cazuza, mais parcerias e assinaturas próprias, Calcanhoto mergulha numa aparente calmaria acústica, mas que esconde tensões líricas e eletrônicas, tão sutis quanto certeiras.

Abrindo o disco, a faixa-título se apresenta em intenções noturnas, iluminadas pelo balanço bossa-nova dos violões dela e de Moreno Veloso, seguida de perto pela parceria com Dé Palmeira, Seu Pensamento, em que entre discretas filigranas eletrônico-acústicas a cantora desfila toda a sensibilidade dramática de sua voz delicada e penetrante.

Embelezada pelo cello grave e solene de Moreno, Teu Nome mais secreto (última parceria dela com Waly Salomão) segreda entre dedilhados de violão: “Só meu sangue sabe tua seiva e senha/ E ri das margens cegas de tuas elétricas ribeiras/ Senhas de tuas grutas ignotas”.

Porto Alegre, de Péricles Cavalcanti, apesar de ser uma das melhores canções do álbum, quase não entra no corte-final. Encomendada por Adriana a Péricles, acabou deixada de lado por não “caber” no disco, e só foi retomada depois, por acaso, em alguns ensaios em que o guitarrista Kassin atribuiu um sabor de guitarrada paraense aos arranjos da canção que, apesar do nome, homenageia o mito grego de Calipso, a ninfa do mar, e acabou ganhando a companhia luxuosa da voz de Marisa Monte.


Rodrigo Amarante colabora com o piano elegante de Para Lá, onde, entre os arranjos líquidos da guitarra do produtor Arto Lindsay, a letra de Arnaldo Antunes contempla o particular no infinito: “E a montanha iniste em ficar lá, parada/ A montanha insiste em ficar lá, para lá, parada/ Parada.”

Com Maré Adriana Calcanhoto se afasta ainda mais de sua faceta de maior sucesso, da época do disco de seu alter-ego infantil Adriana Partimpim, e se assume como cantora “cult”, desinteressada das multidões e mergulhada num universo literário-musical nada popular, mas tão sensível e notável quanto misterioso.
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