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quinta-feira, fevereiro 04, 2010

Penumbroso e Envolvente

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Se sozinho o Macaco Bong já é a melhor coisa do novo rock brasileiro, liderando o comboio formado pelo pianista pernambucano Vitor Araújo, pelo naipe de metais do Móveis Coloniais de Acaju, pelo percussionista do Porcas Borboletas, e pelo ex-Mestre Ambrósio Siba, a coisa tomou contornos de covardia. A assembléia instrumental aconteceu em duas datas, mês passado, no auditório de um dos principais cartões postais de São Paulo, o Parque do Ibirapuera, dentro da programação do festival Alto Verão.




Ruminando certo arrependimento por não ter ido conferir de perto, descobri no Twitter que o show havia sido todo gravado e um link com a peça preciosa chegou aqui, semana passada, numa janela do msn, e de lá logo aboletou-se num canto nobre do meu agá-dê: com a soma usual de baixo-guitarra-bateria acrescida de tantos acessórios, o trio cuiabano flanou ainda mais à vontade no improviso, mergulhando as canções de Artista Igual Pedreiro, seu elogiado disco de estreia, (e até a inédita “Um G Bem Quente”) numa atmosfera ainda mais etérea, penumbrosa e envolvente.


Se o jazz, até então, não ia além de uma intuitiva e habilidosa insinuação, em meio às ondulações eróticas e gatilhos de violência instrumental, nessa reunião superlativa o diálogo entre a concupiscência da guitarra de Bruno Kayapy e a esperteza melódica do piano de Vitor Araújo, encaixado por sobre o frenetismo calculado dos metais e o reboar oco da percussão, arrastaram as belas suítes do grupo para perto da síncope perfeita.


E tanta beleza é evidente apesar da crueza da gravação, que para o lançamento oficial deve recuperar o equilíbrio dos volumes numa mixagem atenciosa, que traga de volta à tona o som da rabeca do Siba, soterrada pelo sismo ensaiado do resto da turma, e que só se deixa perceber de fato no final da apresentação, em “Vamodahmaisuma”, depois de calado o coro de vocalizações e de a maioria dos instrumentos emudecer.




Se Artista Igual Pedreiro (a despeito do slogan menos musical que político), é a representação melhor acabada do triunfo do talento na nova música independente brasileira – aquela que foge da derivação, transborda o gueto e desconhece rótulos limitantes –, depois de reger a corte com tanta perícia, o Macaco Bong corre o risco de acumular também uma espécie de símbolo máximo do êxito coletivo dessa geração.


E isso é só o começo.



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